domingo, 4 de outubro de 2009

Caos urbano - Tema da semana

PRPOSTA DE REDAÇÃO:

Bons tempos em que as águas de março fechavam o verão. Hoje, qualquer chuva acima da média – em qualquer mês do ano – pode ser traduzida em tragédias, transtornos prejuízos. Abordamos aqui São Paulo e Rio ( e cidades estrangeiras), mas o drama se estende por todas as grandes cidades do país. Em médias cidades, como as da região central do estado, já começamos a vivenciar tais problemas. É preciso repensar a vida nas urbes. Que atitudes podem tomar os poderes públicos e a sociedade civil? Redija uma dissertação sobre o tema.

Texto 1:

Brasil Impermeável.
    Por Ruy Castro - Folha de São Paulo, 12/09/2009
Em 1500 e poucos, por aqui chegaram quando os conheceram e tupinambás, os portugueses se impressionaram com a voz macia dos Guerreiros e a beleza de suas mulheres. Eu sei, isso parece receita de bossa nova, mas está na História do Brasil. Tais qualidades, dizia-se, eram provocadas pelas folhas e Águas Claras do Rio Carioca, que os indígenas bebiam e onde se banhavam.
O Carioca não nascia Corcovado, descia, quebrando e pelas encostas, depois, se espalhava pelos futuros Cosme Velho, Laranjeiras, Catete e Glória, desaguava na Praia do Flamengo. Com o tempo, vieram a ocupação do solo, a cidade, a poluição e, depois de séculos, engolindo lixo humano e industrial, o Rio Carioca, já quase à morte, foi canalizado. Hoje, restam poucos trechos a céu aberto, e a maioria dos cariocas nunca molhou um dedo em suas águas.
Vida que segue e, principalmente durante os furores desenvolvimentistas de JK e do ‘milagre’, canalizamos inúmeros outros rios urbanos, trocamos os últimos paralelepípedos por asfalto, derrubamos árvores para plantar concreto e cimentamos Parques, terreiros e Quintais. Enfim, impermeabilizamos o Brasil.
As cidades ficaram reféns dos automóveis. A idéia de salvar um rio, pôr abaixo um viaduto ou trocar uma marginal por um jardim – quando alguém se atreve a tê-la, é tida como crime de lesa-trânsito. É normal: entre o carro e o cidadão, os Governos sempre ficaram com o carro. Mas a natureza tem suas leis e, de tempos em tempos, convoca os deuses da chuva. Sem ter para onde ir, as águas se voltam contra nós.
Os tupinambás tiveram sorte: foram dizimados muito antes que o Rio Carioca entrasse pelo cano. Já nossa agonia será mais longa. Podemos nos afogar nas mesmas águas que sonegamos ao Brasil quando decidimos asfixiá-lo.


Texto 2:
"Paris e SP estão  à beira do colapso", afirma arquiteto francês 
Mário Gioia - da Folha de S.Paulo – 13/09/2009
Uma cidade flexível, repleta de parques por diversos bairros, transporte fácil e qualidade de vida acessível a todos os habitantes. Essa metrópole ideal, imaginada pelo arquiteto Christian de Portzamparc, é quase uma utopia, frente aos graves problemas enfrentados por locais tão diversos como São Paulo, Paris e Pequim.
"Paris, assim como São Paulo, está à beira do colapso", afirma Portzamparc, 65, o principal arquiteto em atividade na França e ganhador do Prêmio Pritzker (o Nobel da arquitetura), no ano de 1994.
"Quando eu falo na França que Paris vive os mesmos problemas de São Paulo, as pessoas acham que é um exagero, mas não é", diz ele. "As metrópoles são fenômenos novos. Suas dificuldades devem ser enfrentadas de novas maneiras."
À frente de um dos dez escritórios de arquitetura contratados pelo governo Sarkozy para reformular o urbanismo da Grande Paris em um período de 20 a 40 anos , Portzamparc esteve em Brasília na segunda e na terça para participar de seminário internacional sobre as metrópoles.
De lá, pela TV, viu o caos que se abateu sobre São Paulo após temporal, na terça. "É uma situação esperada. Privilegiar grandes vias expressas [como as marginais] e o transporte individual termina por criar coisas desse tipo."
Para Portzamparc, as grandes avenidas criam, pouco a pouco, bairros-enclaves, que não se relacionam com o restante da cidade de forma sustentável. "Em Paris, por exemplo, essa circulação expressa cria setores segregados. Isso cria espaços sem futuro, que vivem unicamente de um tipo de atividade. Uma cidade sustentável tem de ser flexível."
Por isso, o arquiteto observa semelhanças entre as atuais configurações da capital francesa e seus arredores e da Grande São Paulo. "A separação física e social, os problemas gerais de transporte, resultaram, em 1995, na grande onda de violência pela qual passaram Paris e outras cidades francesas. São Paulo não passou por isso, mas também vive um problema grave de circulação."
Pequim, que o urbanista visitou recentemente, também está optando por um modelo errado, segundo ele.
"É uma loucura, eles têm seis ou sete autoestradas periféricas e não investem nada em transporte público. Por que não? Porque todas as indústrias automobilísticas estão lá e vão investir em décadas de crescimento do mercado automobilístico na China, uma coisa imensa."
Soluções
O conceito de cidade flexível proposto por Portzamparc para Paris reinventa uma antiga ideia sua, a de quadra aberta, junto de grandes intervenções sobre o tecido urbano da capital e seus arredores.
O plano cria "arquipélagos" verdes, parques espalhados por diversas regiões e espaços ociosos de linhas férreas.
Transporte coletivo é  outro foco do programa, com a construção de um monotrilho (espécie de metrô) sobre o atual anel periférico da Grande Paris, além de outras linhas para integrar todas as cidades.
"Falo em quadras abertas há 20 anos, cujo centro é a rua, uma invenção extraordinária. Temos de revalorizar a rua, que é a verdadeira organização espacial de democracia, onde pobres e ricos andam lado a lado."
Brasil
Fascinado pela arquitetura brasileira feita por nomes como Oscar Niemeyer e Affonso Eduardo Reidy (1909-1964, que projetou o MAM Rio), "a melhor do mundo quando a estudava na adolescência, nos anos 60", Portzamparc diz que espera que seu projeto no Rio, a Cidade da Música, seja concluído no final do ano que vem.
"Seria uma coisa desastrosa se não a finalizassem. Existem detalhes de acústica muito específicos que devem ser seguidos. O público de um concerto da Orquestra Sinfônica Brasileira e da Osesp, por exemplo, merece receber um bom som."

Texto 3:

Frota de veículos em São Paulo cresce acima da média em março e amplia o "nó" do trânsito na maior cidade do país – 24/04/2008

Ana Luisa Bartholomeu

Após atingir a marca histórica de 6 milhões de veículos em fevereiro, a frota de São Paulo cresceu acima da média no mês de março: dados recém-divulgados pelo Detran-SP (Departamento Estadual de Trânsito) mostram que 48.571 novos veículos foram emplacados na capital paulista em março, contra 29.902 em fevereiro e 26.722 em janeiro.
É o maior crescimento de veículos na frota registrado em um mês, analisando-se o período entre janeiro de 2007 até agora. A frota de veículos novos que saiu às ruas em março é 64% maior do que a média mensal de crescimento em todo o ano de 2007, que foi de 29.035 veículos novos ao mês.
A frota cresce em ritmo impressionante. Em 12 meses (de março de 2007 a março de 2008), o total de veículos em São Paulo subiu 6,7%, proporção quase 16 vezes maior que o ritmo de crescimento da população de São Paulo (0,41% ao ano em 2006 e 2007, segundo a Fundação Seade).
Comparando-se os primeiros trimestres de 2007 e 2008, o crescimento da frota também mostra-se elevado. O número total de veículos emplacados nos três primeiros meses de 2008 foi de 105.195, o que representa um aumento de 45% em relação ao mesmo período de 2007, quando 72.147 veículos novos saíram às ruas.
São Paulo ganha cerca de mil novos veículos por dia, de acordo com o Detran-SP. Em março, esse número subiu para 1.500. Existe, hoje, aproximadamente um veículo para cada dois habitantes na capital. Se enfileirada, toda a frota de 6.067.707 veículos seria quase suficiente para dar uma volta na Terra, que tem cerca de 40 mil quilômetros de circunferência.
O bom momento econômico do país, com os expressivos resultados de vendas apresentados mês a mês pela indústria automobilística, paradoxalmente contribui para a piora do problema urbano enfrentado por São Paulo: carros demais para ruas de menos. Nos últimos dez anos, o número de veículos cresceu 25%, enquanto a infra-estrutura urbana, com a quantidade de ruas e avenidas, aumentou apenas 6%, segundo dados da CET (Companhia de Engenharia de Tráfego).
Essa "invasão sobre rodas" nos 17,2 mil quilômetros de vias da capital é um dos fatores que impulsiona os crescentes recordes de congestionamentos registrados na maior cidade da América do Sul.
 (...)
Existe solução para a cidade voltar a andar? "Diria que estamos caminhando para o caos no trânsito, e a uma velocidade média maior que aquela que enfrentamos atualmente nas ruas e avenidas da cidade. Mas não diria que o colapso é iminente, ainda há espaço para revertermos esta situação. A complexidade das soluções varia desde ações educativas voltadas aos motoristas até o término de obras complexas, como metrô e Rodoanel", afirma Dario Raiz Lopes, ex-secretário de Transportes do Estado de São Paulo.
(...)
Agora é tarde para remediar? "Existe solução para o problema de transporte coletivo em São Paulo. Para o trânsito de transporte individual, nunca mais", crava Figueira. "É necessária a definição de uma política pública de transporte, circulação, uso e ocupação do solo urbano, que seja abrangente e concatenada", decretou o professor da USP (Universidade de São Paulo), Jaime Waisman.
Prejuízos
Além de estresse aos motoristas, o gargalo do trânsito de São Paulo traz também prejuízo aos cofres públicos. Segundo a Secretaria de Estado dos Transportes Metropolitanos, o trânsito da região metropolitana de São Paulo gera um custo de R$ 4,1 bilhões por ano.
 (...)
Os números da expansão urbana em São Paulo impressionam. No ano passado, o crescimento da população de favelas foi de 4%, o dobro do ano anterior. E em uma década o número de moradores em barracos aumentou de três a quatro vezes mais que o restante da população (Estado, 9/5). Há uma década já havia 1.062 favelas com mais de 50 habitantes na cidade (IBGE). Só na bacia da Represa de Guarapiranga são 200 mil domicílios, dos quais 40 mil despejando esgotos sem tratamento na água que abastece 4 milhões de pessoas. E nem se pode esperar que os recentes programas habitacionais possam encaminhar soluções: 50% da população do Município não tem renda suficiente para conseguir financiamento. Para complicar, 1.108 loteamentos com 1,2 milhão de moradores são irregulares .
O arquiteto Jaime Lerner, que se destacou por algumas políticas urbanas em Curitiba, tem advertido que é preciso não repetir erros que já custaram muito: não permitir a ocupação de áreas de encostas e topos de morros; não permitir que prossiga a impermeabilização do solo (São Paulo tem 300 rios confinados ou sob o solo urbano); não permitir adensamento excessivo; não ocupar áreas de inundação natural de rios; não acreditar que a solução para problemas de trânsito esteja na implantação de elevados, viadutos, passagens subterrâneas etc., que em geral “apenas transferem de lugar os congestionamentos”.
(...)
Adiantará, diante de tantos problemas, as pessoas se fecharem em condomínios que se transformam em bairros privativos, dotados de apartamentos, escritórios, minishoppings e áreas de lazer (17/3)? Será um bom caminho autorizar construtoras a excederem limites de verticalização em troca de mais recursos para a administração pública, se o avanço decisivo do metrô (solução real) se dá a passos lentíssimos?
O congestionamento recorde de quase 300 quilômetros no trânsito, na véspera do feriado de Corpus Christi, é um alerta em altos brados. É preciso rediscutir tudo – restrições ao licenciamento de veículos, pedágio urbano, formatos de rodízio, inspeção veicular obrigatória para emissões de gases, regras para motocicletas, disciplina rígida para licenciar loteamentos (com exigência de infraestruturas a cargo dos incorporadores, sem repassá-las para o poder público). E muito mais.
E é fundamental convocar para essa discussão ampla – e que chegue à sociedade – as universidades. Como lembrou à Agência Fapesp recentemente o professor Nestor Goulart, da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP, “o grosso da urbanização é feito à margem da lei” e “os investimentos públicos são inócuos”, até porque “a legislação é municipal, mas os problemas são intermunicipais”. O professor José Souza Martins já escreveu neste jornal ser grave que não se discutam macropolíticas urbanas – só projetos localizados que tratam de interesses localizados.
Se não houver discussões mais amplas, como avançar nesse emaranhado que já se torna tema para a política nacional de defesa?
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Texto 4
Juliana Cardilli
Do G1, em São Paulo , 25/02/08

Veja as soluções apontadas por especialistas
Para Cândido Malta Campos Filho, professor de planejamento urbano da Universidade de São Paulo (USP), com investimentos no metrô, microônibus de qualidade, repovoamento do centro e implementação de pedágio urbano, a cidade pode ser outra em 10 anos. “Se tudo for feito certinho e começar logo, em 10 anos o problema estaria resolvido e a cidade funcionaria como se fosse planejada”, conta.
Para o professor, o ponto chave para o início das mudanças é o pedágio urbano. “Sem ele, não vamos conseguir sair da situação existente hoje. Ele tem dupla função: desestimula o automóvel e gera dinheiro para uma implantação mais acelerada do metrô”.
A urbanista Nádia Somek também acredita que são necessárias medidas regulatórias, como o aumento dos dias ou horários do rodízio de veículos. Entretanto, ela ressalta que atitudes municipais e locais não adiantam muito enquanto o estado e a região metropolitana continuarem sendo o centro das riquezas do país.
“As medidas regulatórias são antipáticas do ponto de vista da população geral, por isso os gestores públicos têm receio de tomá-las”, explica. “É preciso uma atitude do governo federal, um projeto de desenvolvimento para distribuir essa população. Hoje, não se faz nada para evitar essa concentração territorial”.
Pedágio urbano
Segundo Cândido Malta, com pedágio de cerca de R$ 4, o dinheiro arrecadado seria suficiente para criar, em 10 anos, 160 km de linhas de metrô a mais que o existente agora. “São 16 km de linhas por ano, o que, além de criar empregos, vai gerar uma melhora gradual na cidade. As pessoas vão sentir uma espécie de revolução”, conta.
A sua implantação, porém, depende de soluções em curto prazo para que as pessoas tenham uma alternativa no transporte público para o centro expandido que as façam deixar o carro em casa. O professor acredita que a solução imediata seria a implantação de um modelo semelhante ao de Porto Alegre - onde microônibus nos quais todos andam sentados, com ar-condicionado e tarifa 80% mais cara que o transporte comum, atraíram aqueles se deslocavam de carro até o Centro Histórico da cidade.
“Quanto mais rápido for implantado o pedágio, mais rápido a situação começaria a melhorar. Entretanto, essa medida é polêmica, e é necessária coragem política para defendê-la e implantá-la”. O professor acredita, porém, que a maior parte da população seria a favor. “Cerca de 60% das pessoas não usam o automóvel, portanto não seriam afetadas pela medida. E, entre os outros 40%, metade concordaria ao perceber que não há solução”.
  Exemplos
Citadas como exemplos mundiais, as soluções encontradas para Bogotá, capital da Colômbia, e Curitiba, no Paraná, não seriam tão aplicáveis à realidade paulistana, de acordo com Cândido Malta. O sistema de ônibus encontrado nos dois locais, cortando as cidades, seria difícil de ser reproduzido em São Paulo.
 “Em Bogotá, ele funcionou porque a cidade tem um modelo de construção espanhol, com sistemas viários mais amplos, com grandes avenidas. O modelo português, como o de São Paulo, é bem mais acanhado”, explica o professor. Para ele, em Curitiba as mudanças foram possíveis por causa de um planejamento urbano muito antigo, conseguido pela continuidade administrativa e apoio popular.
“O sistema viário de São Paulo é um gigantesco problema, pois está esgotado e privilegia os carros e motos. Acaba sendo mais barato comprar uma moto do que andar de ônibus”, considera Cândido Malta.
Indústria automobilística
A venda dos automóveis também  é destacada como uma interferência no trânsito pela urbanista Nádia Somek. “O modelo de desenvolvimento econômico do país está concentrado nos automóveis”, afirma. Ela diz que a necessidade de muito mais transporte coletivo é amplamente conhecida, mas ninguém toma providências.
“Não podemos pensar que as indústrias vão querer deixar de produzir automóveis. Mas elas não perceberam que se continuar assim ninguém mais vai sair do lugar. Para que haja espaço para novos automóveis é preciso investimento no transporte coletivo”.
As saídas para o caos urbano em grandes centros como a cidade de São Paulo

 1. Implantação do pedágio urbano. Ter que pagar para acessar o centro expandido da cidade desestimularia o uso de carros na área do rodízio municipal e melhoraria a situação do trânsito.
2. Malha de microônibus de qualidade. A colocação de veículos de transporte público com ar-condicionado e assentos para todos – mesmo com tarifa mais alta – atrairia os motoristas que não querem pagar o pedágio mas não abrem mão do conforto e da qualidade do transporte.
3. Construção de novas linhas de metrô. O dinheiro arrecadado pelo pedágio seria utilizado para a construção de mais quilômetros de metrô, atingindo mais pontos da capital e servindo a mais pessoas.
4. Repovoar o centro. Bairro teve êxodo de habitantes para a periferia e tem espaço para a habitação. Morando no centro, diminui a necessidade de atravessar a cidade para parte da população.
5. Desestimular o uso intenso do automóvel. A indústria automobilística gera empregos e renda. É preciso estimular a compra e desestimular o uso intenso. As pessoas precisam passar a usar o carro apenas fora dos momentos de pico, para viajar, nos fins de semana, feriados.
6. Descentralizar população e produção de riquezas de São Paulo. Estado e região metropolitana concentram pessoas e riquezas do país. Não necessárias medidas nacionais para distribuir essa população.


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