sexta-feira, 9 de outubro de 2009

Por que aceitar a censura?

Proposta de Redação:
Os textos abaixo abordam a censura, um fantasma que voltou a rondar a democracia brasileira. As visões analisam o tema. Leia-os atentamente e redija uma dissertação sobre o tema:

A quem interessa os mecanismos que restringem a livre manifestação do pensamento e a difusão de informações?

Texto 1:

Por que aceitar a censura?
(Por Luciano Martins Costa em 10/8/2009)


O arquivamento das denúncias contra o presidente do Senado, José Sarney, por iniciativa do presidente do Conselho de Ética, deixou a imprensa brasileira momentaneamente desorientada.
Sem um fato concreto para dar sequência ao processo de desmanche público de Sarney, jornais e revistas do fim de semana preferiram fazer um balanço geral, evitando especular sobre os próximos movimentos das forças em antagonismo no Congresso.
O Globo apostou num debate entre especialistas sobre a existência do Senado Federal. A Folha de S.Paulo simplesmente abandonou o assunto. O Estado de S.Paulo desviou-se um pouco do caso Sarney para avaliar como esses escândalos paralisam os trabalhos legislativos, e apresentou um levantamento da sucessão de denúncias que envolvem o Senado desde 2001, quando o então presidente da Casa, Jader Barbalho, foi obrigado a renunciar.
Direito legítimo
Nas edições de segunda-feira (10/8), os jornais voltam a acreditar que o Senado vai mudar a decisão do presidente do Conselho de Ética e levar Sarney a julgamento. Mas a Folha cria um fato novo, ao noticiar que também o presidente do PSDB, senador Sérgio Guerra, andou cometendo irregularidade, ao mandar para as contas públicas as despesas de viagem da filha a Nova York.
Com isso, a tropa de choque de Sarney ganha munição para seguir mantendo sua tática de intimidação.
O Estadão coloca todo o noticiário sobre o Senado na série "Estado sob censura", procurando amplificar a repercussão da decisão do juiz Dacio Vieira, do Distrito Federal, que proíbe o jornal de publicar informações sobre as investigações que atingem o empresário Fernando Sarney, filho do senador José Sarney.
Talvez fosse o caso de refletir se a atitude do jornal, de se apresentar como vítima de censura, seja a melhor para seus leitores e para a sociedade. Imagine-se o que aconteceria se o mais do que centenário Estadão, veterano de outras porfias e tentativas de intimidação muito mais severas, decidisse enfrentar a censura e publicasse uma ampla reportagem sobre os negócios de Fernando Sarney?
Que tal se o jornal, em vez de ficar se lamentando, exercesse o legítimo direito da desobediência civil contra essa medida que considera abusiva, pagando a multa imposta pelo juiz Dacio Vieira com apoio de seus anunciantes e leitores?



Texto 2:
Opinião, Estadão e a liberdade de imprensa

(Reproduzido do blog do autor, 2/8/2009; título original "Os Mesquita, o Estadão e a liberdade de imprensa")

Nunca é demais lembrar a resistência do Estado de S.Paulo (e do Jornal da Tarde) à censura – com os versos de Camões, as receitas de bolo e as fotos de flores. É justo lembrar em livro, como fez no 40º aniversário do AI-5, em dezembro do ano passado, o jornalista José Maria Mayrink em seu Mordaça no Estadão, que viveu aqueles tempos difíceis (mais sobre a mídia e o AI-5 aqui, num depoimento de Alberto Dines).
Mas é injusto esquecer que quando Fernando Gasparian, diretor de Opinião, decidiu impetrar mandado de segurança contra a censura em 1973, o mesmo Estadão, por intermédio de seu diretor Ruy Mesquita, ficou atemorizado, negando-se a ser parte da causa .
Eu entenderia se a razão tivesse sido apenas o fato de ser Opinião um semanário alternativo, menor, enquanto o Estadão era um dos jornalões tradicionais do país, muito conhecido até no exterior. Mas Gasparian disse então a Ruy Mesquita que, se o Estadão preferisse não entrar junto com Opinião, estaria bem: entraria sozinho e o semanário, nanico, se somaria apenas depois à iniciativa.
Essa história, com mais detalhes, foi contada pelo próprio Gasparian e está no livro Opinião x Censura – Momentos da luta de um jornal pela independência, de J. A. Pinheiro Machado (Editora L&PM, 1978). O motivo real dos Mesquita (o irmão Júlio estava então fora do país), além do medo de represálias, era o fato de já ter a promessa do general Ernesto Geisel de que a censura do Estadão seria levantada.
(...)
Poupar o Estadão e esquecer o resto?
Um amigo comum do jornal e do futuro presidente, segundo Gasparian, já tinha assegurado aos Mesquita que o novo governo ia tirar a censura do Estadão. De fato, isso ocorreria em 1975. Mas as vítimas menores – Opinião, O São Paulo, Tribuna da Imprensa, Movimento etc – continuariam sob censura implacável. Ao confiar em Geisel, a família Mesquita ficou indiferente à sorte dos demais.

Toda a prática da censura, explicitamente proibida na Constituição em vigor, foi exposta – até com as minúcias ridículas e grotescas – na petição do mandato de segurança levada ao Tribunal Federal de Recursos, a 10 de maio de 1973, pelo advogado Adauto Lúcio Cardoso. Ao final, por 6 votos contra 5, o TFR decidiu: a censura prévia feita no Opinião pela Polícia Federal violava a Constituição.
Consumada a decisão judicial, no entanto, a Polícia Federal avisou a Redação de Opinião pelo telefone: "Não publiquem o jornal sem obedecer à censura. Se isso acontecer, temos ordem para apreender a edição". Na manhã seguinte, o general-presidente Garrastazu Médici, em simples despacho, mandou a PF ignorar a Justiça e manter a censura no jornal, com base no AI-5.
(...)
Um detalhe escabroso de tudo isso é que o tal despacho citado no item 1 (de 30 de março de 1971) teria sido secreto, nunca fora revelado. Assim, o mandado de segurança de Opinião tivera no mínimo o mérito de forçar a ditadura ou a revelar a existência de "despachos secretos" (como sabemos, havia também "decretos secretos"), ou a fabricar um às pressas (e a posteriori) na obsessão de forjar cobertura jurídica para invalidar a decisão do TFR.
A mesma mídia covarde que hoje apregoa compromisso com a liberdade de imprensa – em ataques torpes ao governo Lula e especialmente a outros governos do continente, como o da Venezuela – acovardava-se então (leia aqui sobre o heroísmo do Estadão no passado e sua prepotência atual). Em 1973, recebeu uma lição de coragem cívica, dada por Gasparian, Opinião e o advogado Adauto Lúcio Cardoso. O Estadão, pelo menos, ainda noticiou o fato discretamente em sua primeira página do dia seguinte. O resto da mídia, nem isso.




Texto 3:
Afronta à democracia
(editorial do jornal Estado de São Paulo em 3/08/2009)

Certamente não existem nas Constituições de outras nações sob o regime de Estado Democrático de Direito dispositivos tão explícitos como os contidos na Carta brasileira, que garantam a plena liberdade de expressão e proíbam qualquer forma de censura prévia aos veículos de comunicação. Reunidos após uma prolongada ditadura militar que amordaçou a imprensa, os constituintes trataram de proscrever qualquer forma de censura prévia ou restrição à liberdade de expressão. Assim é que nem a Constituição norte-americana, matriz institucional da liberdade de imprensa, dispõe de regras tão claras como as estabelecidas em nossa Constituição. No artigo 5º, item IX, ela assegura a livre comunicação; no item XIV, assegura a todos o acesso à informação; e, no artigo 220, determina expressamente que a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo, não sofrerá qualquer restrição.
Daí a repercussão indignada, no País e no exterior, que causou a censura judicial imposta a este jornal por um desembargador do Tribunal de Justiça do Distrito Federal. O caso se soma - tendo a sua dimensão aumentada por se tratar de um atentado às liberdades públicas - aos escândalos que envolvem a família Sarney e seu patriarca, que teimosamente insiste em continuar presidindo o Senado da República sem mais dispor de condições políticas ou morais para fazê-lo. Fernando Sarney, filho do senador e principal gestor dos negócios da família, tentou na Justiça Federal obter um mandado que proibisse o Estado de continuar publicando matérias sobre a Operação Boi Barrica, da Polícia Federal, que investiga aqueles mesmos negócios. O pedido foi negado. Tentou, a seguir, o mesmo expediente na primeira instância da Justiça do Distrito Federal, tendo o juiz considerado o pedido - que também negou - "uma afronta à liberdade de imprensa". Apresentado novamente, desta vez ao Tribunal de Justiça do Distrito Federal, o desembargador Dácio Vieira acatou o pedido e impôs a censura prévia a este jornal.
Causa espécie, antes de mais nada, o fato de esse desembargador não ter se declarado impedido de proferir decisão monocrática, uma vez que é profundamente ligado - como mostra foto estampada na edição de sábado do Estado - tanto a José Sarney quanto ao ex-diretor do Senado Agaciel Maia, os principais protagonistas dos escândalos que jorram da Câmara Alta. Antes de ser desembargador, Vieira ocupara um cargo de confiança na gráfica do Senado e fora consultor jurídico da Casa. Nessa condição, recebera do senador maranhense do Amapá, tanto quanto do poderoso ex-diretor-geral do Senado, apoios decisivos para sua investidura no Tribunal.
Como era de esperar, foi imediata e generalizada a reação ao ato de censura prévia, flagrantemente inconstitucional e afrontoso à democracia. Segundo o senador Jarbas Vasconcelos, a escolha "desse caminho pela Justiça é um retrocesso terrível e injustificável". O senador Pedro Simon condenou: "O homem da transição democrática agora comete um ato da ditadura." O senador Eduardo Suplicy enfatizou que "é um direito da população ser informada sobre diálogos que ferem a ética". E a Associação Nacional de Jornais (ANJ), por seu vice-presidente e responsável pelo Comitê de Liberdade de Expressão, Julio César Mesquita, condenou veementemente a decisão do desembargador Vieira, depois de destacar que é inaceitável que pessoas ligadas à atividade jornalística (como é caso da família Sarney, que controla jornais, rádios e televisões) "recorram a um expediente inconstitucional, conforme recente decisão do Supremo Tribunal Federal, para subtrair ao escrutínio público operações com graves indícios de ilegalidade". O ex-presidente do Supremo Carlos Veloso, por sua vez, considerou a medida judicial um excesso, que de fato constituiu uma censura. Na mesma linha pronunciaram-se representantes da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e pessoas preocupadas com a ameaça à liberdade de expressão.
Mais importante do que o direito que tem o jornal de informar é o direito que tem o cidadão de ser informado - dizia a Suprema Corte norte-americana, interpretando, na década de 1970, o sentido da liberdade contido na Primeira Emenda. Esperemos que a Justiça brasileira trilhe esse caminho e não permita que prosperem afrontas à democracia que a sociedade brasileira, apesar de tudo e a duras penas, tem conseguido construir.

Texto 4:
Proibições do "dotô coroné prefeito"
(Por Deonísio da Silva em 4/8/2009)


Na madrugada de 13 de dezembro de 1968, o jornal O Estado de S.Paulo foi apreendido pela Polícia Federal. Poucos exemplares chegaram às bancas naquele escuro alvorecer. Caía uma longa noite sobre o Brasil com data marcada. Era decretado o Ato Institucional número 5. É curioso que o primeiro não tem número. Nem os militares queriam fazer o segundo. Mas os filhotes se multiplicaram, sendo o AI-5, como ficou mais conhecido, o pior deles.
Julho de 2009, mais de quarenta anos depois: o mesmo jornal é proibido de publicar o que apurou, agora em plena (?) democracia, não mais por censura do Executivo, mas do Judiciário.
Vamos a outros parâmetros. José Simão não pode escrever sobre a atriz Juliana Paes, assim como Paulo Francis não pôde escrever sobre o senador Eduardo Suplicy. Os dois casos se deram um bom tempo depois de passada a ditadura militar.
Nenhuma diferença faz para os leitores de O Estado de S.Paulo lerem receita de bolo ou versos de Os Lusíadas na primeira página, como nos tempos da ditadura, e ficar sem saber o que a Polícia Federal, agora a serviço da democracia, liberou sobre os escândalos do Senado. O resultado é o mesmo. Os leitores foram fraudados, esbulhados, ou outro termo jurídico apropriado a definir com precisão o direito que lhes foi surrupiado. Ou temos que trabalhar com a hipótese de que a mesma instância que antes proibia a publicação de dados factuais agora libera coisas indevidas? Se assim for, a culpa é do mensageiro?
O poder tem algo de insano
O Judiciário foi a instância a que recorreram, quase sempre com êxito, apesar dos percalços nas primeiras etapas, os escritores perseguidos do período pós-64, que ali procuraram o remédio para os males do autoritarismo. Agora, o Judiciário atende a interesses
particulares contra o interesse público?
O caso-síntese foi o de Rubem Fonseca, cujo livro Feliz Ano Novo, proibido em 1976, somente veio a ser liberado em 1989. Os prejuízos para autor e editora – mas, principalmente, para o público – foram incalculáveis. A remuneração concedida não contemplou todos os prejuízos. A censura tem efeitos que podem ser reparados, mas tem alguns irreparáveis para toda a vida, que às vezes azucrinam também os descendentes de quem foi censurado.
Disso estava tão certa já a avó de Dom Pedro I que, na sentença da devassa, estendeu as penas aos descendentes de José Joaquim da Silva Xavier, herói de nosso primeiro projeto de independência política. Creditaram o exagero à demência de Dona Maria I, a Louca, mãe de Dom João VI. Mas o poder tem em si mesmo algo de insano, que é preciso conjurar com controles apropriados.
A Sucupira de Dias Gomes
Outro dia, o presidente do STF, Gilmar Mendes, ameaçou chamar às falas o presidente Lula. Indevidamente, como ficou claro. Por que está demorando tanto a chamar às falas os censores de toga? É verdade que também o presidente Lula, em 2005, quis expulsar do Brasil o jornalista americano Larry Rohter, do New York Times, aliás o primeiro a registrar, ainda em 1978, notícia amplamente favorável ao então líder sindical no jornal Washington Post, onde trabalhava.
A censura, como se vê, é norma, e não exceção, no Brasil. Está ali na prateleira para qualquer eventualidade. E é um tiro pela culatra para quem dela lança mão para calar o outro. Voltará sempre com mais vigor a força da palavra que, uma vez levantada a proibição, brilha em todo o seu esplendor, o esplendor da verdade.
Do contrário, o Brasil se transformará na Sucupira de Dias Gomes, onde o "dotô coroné prefeito" concentra todos os poderes, sendo o mais problemático justamente o quarto poder, difícil, para não dizer impossível, de ser controlado.

Texto 5:

A censura é a pílula anticoncepcional da cultura.
(Carlos Eduardo Novaes, jornalista)

Texto 6:

Censura é o uso pelo estado ou grupo de poder, no sentido de controlar e impedir a liberdade de expressão. A censura criminaliza certas ações de comunicação, ou até a tentativa de exercer essa comunicação. No sentido moderno, a censura consiste em qualquer tentativa de suprimir informação, opiniões e até formas de expressão, como certas facetas da arte.
O propósito da censura está na manutenção do status quo, evitando alterações de pensamento num determinado grupo e a consequente vontade de mudança. Desta forma, a censura é muito comum entre certos grupos, como certas religiões, multi-nacionais e governos, como forma de manter o poder. A censura procura também evitar que certos conflitos e discussões se estabeleçam.
A censura pode ser explicita, no caso de estar prevista na lei, proibindo a informação de ser publicada ou acessível, após ter sido analisada previamente por uma entidade censora que avalia se a informação pode ou não ser publicada (como sucedeu na ditadura portuguesa através da PIDE) , ou pode tomar a forma de intimidação governamental ou popular, onde as pessoas têm receio de expressar ou mostrar apoio a certas opiniões, com medo de represálias pessoais e profissionais e até ostracismo, como sucedeu nos Estados Unidos da América com o chamado período do McCartismo .
Pode também a censura ser entendida como a supressão de certos pontos de vista e opiniões divergentes, através da propaganda, manipulação dos média ou contra-informação. Estes métodos tendem a influenciar e manipular a opinião pública de forma a evitar que outras ideias, que não as predominantes ou dominantes tenham receptividade.
Uma forma moderna de censura prende-se com o acesso aos meios de comunicação e também com as entidades reguladoras (que atribuem alvarás de rádio e televisão), ou com critérios editoriais discricionários (em que, por exemplo, um jornal não publica uma determinada notícia).
Muitas vezes a censura se justifica em termos de proteção do público, mas na verdade esconde uma posição que submete os artistas ao poder do estado e infantiliza o público, considerado como incapaz de pensar por si próprio.
Atualmente a censura pode ser contornada mais eficazmente, com o recurso à Internet, graças ao fácil acesso a dados sem fronteira geográficas e descentralizado e aos sistemas de partilha de ficheiros peer-to-peer, como a Freenet.
O uso cotidiano da censura promove um movimento de defesa bastante corrosivo que é a auto-censura, quando os produtores culturais e formadores de opinião evitam tratar de questões conflitivas e divergentes.


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