sexta-feira, 9 de outubro de 2009

Um desafio amazônico

PROPOSTA DE REDAÇÃO

Os textos abaixo fazem referência à Amazônia, sua ocupação, o binômio preservação com sustentabilidade/degradação e a abordagem dada ao tema pela mídia nacional e internacional. Como sociedade – e, portanto, opinião pública – até que ponto temos consciência sobre a necessidade de sua preservação e sobre os danos causados a ela em nome do “desenvolvimento econômico” ? Reflita sobre tal questionamento e redija uma dissertação sobre o tema.

Texto 1:
Um desafio amazônico - Por Luciano Martins Costa em 16/6/2009

A imprensa finalmente produziu um trabalho sobre a Amazônia capaz de esclarecer o leitor sobre a necessidade de políticas eficientes, integradas e de longo prazo para a preservação da floresta, do cerrado e do patrimônio que guardam.
A reportagem em questão explica a importância de preservar as imensas extensões florestais do Brasil: elas absorvem uma quantidade impressionante de carbono, e sua derrubada representa 20% das emissões mundiais de gases nocivos. Na ponta do lápis, interromper o desmatamento poderia ser a melhor maneira de cortar as emissões de gases que produzem o aquecimento global.
Seria uma solução mais rápida, mais eficiente e mais duradoura do que as outras medidas que estão em progressão lenta, como a substituição das fontes de energia e de combustíveis, que vão levar anos e custar bilhões.
O texto citado aborda ainda as melhores políticas para assegurar a preservação do patrimônio florestal da Amazônia, resumidas em duas frentes: estabelecer claramente os direitos de propriedade na região, com as devidas responsabilidades, e remunerar os proprietários por preservar as árvores.
Se essas políticas podem funcionar em algum país, esse país é o Brasil, que possui 60% das florestas tropicais do planeta.
Leitura útil
A reportagem entra também na importância estratégica que tem a preservação da floresta para o Brasil, no momento em que se lança como candidato a protagonista no cenário global: a devastação causa tremendo dano à reputação do país que é o pioneiro em fontes renováveis de combustíveis e, principalmente, a destruição da floresta ameaça alterar o sistema climático que viabiliza o Brasil como um dos maiores exportadores mundiais de produtos agrícolas.
Essa reportagem está disponível para o público.
Ela esclarece que 40% do território amazônico no Brasil é ocupado por reservas indígenas e parques nacionais, áreas legalmente protegidas mas permanentemente ameaçadas por causa da falta de regularização fundiária e pelo avanço da pecuária e outras atividades predatórias.
A reportagem em questão entra ainda na análise da Medida Provisória 458, aprovada com alterações pelo Congresso Nacional e que pretende legalizar a propriedade privada das terras na Amazônia.
É leitura muito útil para entender a questão amazônica. Pena que não esteja disponível na grande imprensa nacional. Essa reportagem está publicada na presente edição da revista britânica The Economist .
Amazônia aos pedaços
A imprensa brasileira ainda trata a Amazônia no varejo, pontualmente. Quando produz uma edição especial, é quase sempre sobre as belezas naturais, quase como guias de turismo cheias de ufanismo, com belas fotografias, sobre um patrimônio que corre sério risco de desaparecer. Raramente se pode ver, na imprensa nacional, uma reportagem ambiciosa como a da Economist desta semana.
Na edição de terça-feira (16/6), por exemplo, o Estado de S.Paulo traz a análise de um estudo apontanto a importância das unidades de conservação para impedir a crescente transformação da floresta em savanas. O estudo foi publicado originalmente numa revista da Academia Nacional de Ciências dos Estados Unidos.
O Globo publicou no domingo (14/6) estudo do Instituto Imazon demonstrando que apenas 14% dos crimes ambientais foram punidos na Justiça, no período de 1997 a 2006. Mais recentemente, observa o jornal carioca, a legislação se tornou mais rigorosa, reduzindo prazos para recursos e criando a possibilidade de apreensão e leilão de gado e madeira de origem ilegal.
Na terça-feira (16), o Globo informa que o ministro do Meio Ambiente está pedindo ao Supremo Tribunal Federal a criação de varas especializadas para o julgamento de crimes ambientais. Nos últimos dias, a imprensa nacional também noticiou que o Conselho Monetário Nacional cortou o crédito de quem pratica crimes ambientais e citou o caso das empresas que vendem carne originária de fazendas ilegais da Amazônia. No entanto, nenhum desses temas teve uma sequência ou mereceu uma edição mais ambiciosa.
Os jornais e revistas brasileiros evitam tratar a questão amazônica de maneira abrangente, como fez a britânica The Economist. Talvez porque isso implique colocar em discussão o papel do agronegócio na destruição da floresta.
O agronegócio é grande anunciante e importante aliado político no sistema de poder que a imprensa representa. Ou talvez seja apenas falta de visão.

Texto 2:
Em 2000, Cristovam Buarque publicou o artigo”A internacionalização do Mundo”, em o Globo. O texto ganhou a internet e o mundo, sendo traduzido para vários idiomas.

A internacionalização do mundo
Fui questionado sobre o que pensava da internacionalização da Amazônia, durante um debate, nos Estados Unidos. O jovem introduziu sua pergunta dizendo que esperava a resposta de um humanista e não de um brasileiro. Foi a primeira vez que um debatedor determinou a ótica humanista como o ponto de partida para uma resposta minha. De fato, como brasileiro eu simplesmente falaria contra a internacionalização da Amazônia.
Por mais que nossos governos não tenham o devido cuidado com esse patrimônio, ele é nosso. Respondi que, como humanista, sentindo o risco da degradação ambiental que sofre a Amazônia, podia imaginar a sua internacionalização, como também de tudo o mais que tem importância para a humanidade.
Se a Amazônia, sob uma ótica humanista, deve ser internacionalizada, internacionalizemos também as reservas de petróleo do mundo inteiro. O petróleo é tão importante para o bem-estar da humanidade quanto a Amazônia é para o nosso futuro. Apesar disso, os donos das reservas sentem-se no direito de aumentar ou diminuir a extração de petróleo e subir ou não o seu preço. Os ricos do mundo, no direito de queimar esse imenso patrimônio da humanidade.
Da mesma forma, o capital financeiro dos países ricos deveria ser internacionalizado. Se a Amazônia é uma reserva para todos os seres humanos, ela não pode ser queimada pela vontade de um dono, ou de um país.
Queimar a Amazônia é tão grave quanto o desemprego provocado pelas decisões arbitrárias dos especuladores globais. Não podemos deixar que as reservas financeiras sirvam para queimar países inteiros na volúpia da especulação.
Antes mesmo da Amazônia, eu gostaria de ver a internacionalização de todos os grandes museus do mundo. O Louvre não deve pertencer apenas à França. Cada museu do mundo é guardião das mais belas peças produzidas pelo gênio humano. Não se pode deixar que esse patrimônio cultural, como o patrimônio natural amazônico, possa ser manipulado e destruído pelo gosto de um proprietário ou de um país. Não faz muito, um milionário japonês decidiu enterrar com ele um quadro de um grande mestre. Antes disso, aquele quadro deveria ter sido internacionalizado.
Durante o encontro em que recebi a pergunta, as Nações Unidas reuniam o Fórum do Milênio, mas alguns presidentes de países tiveram dificuldades em comparecer por constrangimentos na fronteira dos EUA. Por isso, eu disse que Nova York, como sede das Nações Unidas, deveria ser internacionalizada.
Pelo menos Manhattan deveria pertencer a toda a humanidade. Assim como Paris, Veneza, Roma, Londres, Rio de Janeiro, Brasília, Recife, cada cidade, com sua beleza específica, sua história do mundo, deveria pertencer ao mundo inteiro. Se os EUA querem internacionalizar a Amazônia, pelo risco de deixá-la nas mãos de brasileiros, internacionalizemos todos os arsenais nucleares dos EUA. Até porque eles já demonstraram que são capazes de usar essas armas, provocando uma destruição milhares de vezes maior do que as lamentáveis queimadas feitas nas florestas do Brasil.
Nos seus debates, os atuais candidatos à presidência dos EUA têm defendido a idéia de internacionalizar as reservas florestais do mundo em troca da dívida. Comecemos usando essa dívida para garantir que cada criança do mundo tenha possibilidade de ir à escola.
Internacionalizemos as crianças tratando-as, todas elas, não importando o país onde nasceram, como patrimônio que merece cuidados do mundo inteiro. Ainda mais do que merece a Amazônia. Quando os dirigentes tratarem as crianças pobres do mundo como um patrimônio da humanidade, eles não deixarão que elas trabalhem quando deveriam estudar; que morram quando deveriam viver.
Como humanista, aceito defender a internacionalização do mundo. Mas, enquanto o mundo me tratar como brasileiro, lutarei para que a Amazônia seja nossa. Só nossa.

Texto 3:
Entrevista com Cristovam Buarque
Fonte: Jan Schoenfelder em 15/3/2005- Observatório da Imprensa

Passados quatro anos da publicação do artigo, o que mudou na opinião dos americanos a respeito da internacionalização da Amazônia?
Cristovam Buarque – Eu acho que não mudou nada. Se mudou foi para um sentimento ainda mais forte no exterior a respeito da internacionalização devido ao aumento das queimadas e até mesmo devido à violência, continua-se a matar trabalhadores, mata-se uma freira norte-americana na Amazônia e isso leva a cada vez mais defenderem a internacionalização.
Esse questionamento feito pelo jovem americano no debate é uma interpretação apenas dos americanos ou muitos brasileiros também pensam da mesma forma?
C. B. – Não sei se muitos brasileiros pensam da mesma forma, no sentido de internacionalização. Agora, alguns falaram comigo quando leram o artigo e discordaram daquela frase final, que afirma que a Amazônia, enquanto não internacionalizarmos tudo, continua nossa. Eles acham que a gente tem de ter uma responsabilidade maior com a Amazônia. Se não, não se justifica essa afirmação. Um amigo meu, muito conhecido, Sebastião Salgado, me disse que aquele artigo ficaria melhor se não tivesse aquela frase.
A brasilidade continua a ser um sentimento forte do nosso povo?
C. B. – A brasilidade é um sentimento em construção. Só é forte na Copa do Mundo. Tirando a Copa do Mundo não há esse sentimento de brasilidade tão forte. Primeiro que é um país dividido entre excluídos e incluídos. A brasilidade de um pobre nordestino na seca não é a mesma de um rico paulista. A gente não conseguiu ainda costurar aquilo que nos unifique. Interessante é que o Brasil tem tudo para ter isso fácil. Mas, às vezes a sensação é que a Índia tem um sentimento mais forte de Índia que o Brasil de Brasil. E a Índia são 13 línguas, são 23 mil dialetos, um bilhão de pessoas. Mas há um sentimento de Índia. O sentimento de brasilidade, na minha opinião, não estará completo enquanto tivermos incluídos e excluídos no Brasil.
A globalização da economia não corrigiu problemas estruturais dos países pobres. Que tipo de solução teríamos se globalizássemos a cultura, a saúde, a educação?
C. B. – A globalização agravou os problemas. Dividiu mais o Brasil. Até os anos 80, um brasileiro rico se sentia de qualquer maneira mais próximo de um brasileiro pobre do que hoje. Porque hoje ele se ligou lá fora. Hoje criou-se um primeiro mundo internacional dos ricos. Do qual os ricos brasileiros fazem parte. Quando eu falo "rico" estou me referindo a todos aqueles que têm dente na boca, sapato nos pés, concluiu o Ensino Médio. Essa parcela se unificou internacionalmente e se distanciou da parcela pobre. O que fazer para resolver isso? É democratizar a globalização. Como? Com um programa mundial de inclusão social. E isso eu acho que se faz com educação. Segundo, globalizar o conhecimento. Não é possível, num mundo que se diz global, africanos com Aids morrerem quando já existe um coquetel capaz de resolver isso. Mas o conhecimento não é global, é apropriado pelos ricos. A globalização do planeta. A gente tem que começar a proteger mais o meio ambiente, independente do que um povo inteiro quiser fazer com seu país.
A internacionalização do mundo seria o princípio de uma sociedade planetária sustentável?
C. B. – De certa maneira, sim. Mas, essa sociedade planetária exigiria muito mais do que isso. Exigiria um governo que pudesse ser exercido através das fronteiras nacionais. E isso ainda vai demorar muito. Por isso defendo que, enquanto não se pode ter governos planetários, a gente tenha valores éticos planetários que nem a democracia interna de um país possa deixar de cumprir.

Texto 4:

O debate que falta - Por Luciano Martins Costa em 19/5/2009.
O governo federal acaba de tomar decisão importante para a compreensão da estratégia de desenvolvimento que o Brasil adota. Dos grandes jornais diários de circulação nacional, apenas a Folha de S.Paulo registrou a medida. Trata-se da redução do valor que as empresas devem pagar por obras como rodovias e hidrelétricas, a título de compensação por danos ambientais.
O valor estabelecido há quase dez anos era de no mínimo 0,5% sobre o custo total da obra. O Ministério do Meio Ambiente defendia o aumento do piso para 2%, mas, ao contrário das expectativas e da opinião dos ambientalistas, o decreto presidencial noticiado na terça-feira (19/5) pela Folha revela que o Executivo decidiu que 0,5% será o teto máximo da taxa de compensação.
O Estado de S.Paulo ignora o acontecimento, e também não traz outras informações sobre a questão ambiental, porque dedica apenas uma seção fixa, semanal, para o assunto. A edição da terça-feira de O Globo traz o tema meio ambiente no pé do noticiário científico, mas também deixa passar em branco o decreto presidencial.
Trata-se de medida essencial para sinalizar a verdadeira disposição do governo de preservar o patrimônio biológico do país ao mesmo tempo em que procura acelerar o crescimento econômico. E o sinal emitido com esse decreto não é verde.
Oportunidade perdida
As grandes obras já em andamento ou planejadas no Plano de Aceleração do Crescimento – pacote de empreendimentos com os quais se pretende melhorar e ampliar a infra-estrutura de transportes e geração de energia –, têm sido tema constante na imprensa, mas em geral o noticiário se refere a custos ou à conveniência de determinadas escolhas técnicas.
Em raros momentos, no período de quase dois anos em que se desenvolve o PAC, os jornais e revistas colocaram em debate público a estratégia de desenvolvimento no que se refere à sustentabilidade.
O decreto presidencial reduzindo as exigências para a compensação ambiental de grandes obras seria uma grande oportunidade para aprofundar o debate. Mas a imprensa adora perder oportunidades.
Avançando para trás
O valor das compensações ambientais não é o único elemento para avaliar as intenções de planos de desenvolvimento no que se refere à preservação ambiental, mas essa questão não deveria ser descartada dos debates econômicos.
No noticiário recente sobre o tema, os jornais têm dado mais atenção às performances midiáticas do ministro do Meio Ambiente Carlos Minc do que às medidas efetivas que poderiam resguardar o patrimônio do país nos locais onde há grandes obras em andamento. A mais recente participação do ministro no espetáculo noticioso foi seu apoio público às tímidas manifestações que ocorreram em algumas cidades em defesa da descriminalização de drogas. A continuar nesse estilo, Carlos Minc acaba celebrizado como o ministro do Meio Ambiente que se dedicou à defesa de apenas uma espécie vegetal, a cannabis sativa.
A imprensa parece se divertir, ou pelo menos se distrai com o desempenho pouco convencional do ministro. Enquanto isso, em termos ambientais o Brasil anda para trás, sob os olhares complacentes da mídia.

Texto 5:

O partido do desmatamento – por Luciano Costa em 22/04/2009
Os três jornais brasileiros considerados de maior influência abordam nesta quarta-feira o tema da preservação ambiental, mas nenhum deles trata a questão entre as prioridades.
O grande destaque ainda é para os abusos de deputados e senadores no uso de suas verbas para gastos pessoais, e especialmente na generosidade com que distribuem passagens aéreas entre parentes e amigos.
Por trás da agenda assumida pela imprensa, estende-se a disputa partidária, que tem como objeto final a eleição presidencial de 2010.
Por esse motivo, é importante registrar a informação publicada hoje no alto da coluna Panorama Político, do Globo, sob o título “Terra arrasada”.
Ali está registrado o que os outros jornais tentam dissimular: os inimigos da preservação ambiental estão espalhados por todos os partidos, mas um deles, o Democratas, parece ter assumido como objetivo a destruição da legislação ambiental criada no Brasil nos últimos anos e que, com todos os defeitos, ainda é considerada um avanço.
O Globo observa que, enquanto o site do partido apregoa que tem como bandeira o meio ambiente, a senadora Kátia Abreu, do Democratas do Tocantins e presidente da Confederação Nacional da Agricultura, tenta derrubar a legislação de proteção ao patrimônio natural.
Segundo o jornal, "os adversários da legislação ambiental encontraram uma forma para torná-la letra morta". A Confederação Nacional da Agricultura, defendendo a tese de que tanto a União como os Estados podem legislar sobre o assunto, está usando seu poder para incentivar governos estaduais e assembléias legislativas a produzir regras menos rigorosas de controle do desmatamento e uso das margens dos rios.
O modelo da CNA, encampado pelo Partido Democratas, é a legislação de Santa Catarina, Estado campeão de destruição da Mata Atlântica, onde um novo código florestal, conflitante com as normas federais, está sendo contestado pelo Ministério Público.
Os outros jornais também noticiam a controvérsia, mas apenas o Globo esclarece que por trás da tentativa de anular as regras para preservação ambiental está a presidente da Confederação Nacional da Agricultura e, por trás dela, o Partido Democratas.
A agremiação deveria mudar de nome e manter a mesma sigla: Partido do Desmatamento.

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